Camila, @BrasileirasdoMundo
Emille Rosa, Dublin 🇮🇪
Brasileiras do Mundo: Quando e por que você decidiu morar no exterior?
Emille: Eu me mudei pro exterior em Fevereiro de 2016, 6 anos atrás e duas semanas depois de ter completado 19 anos. Saí do interior do Rio Grande do Sul e fui em direção à Irlanda para trabalhar e estudar. A oportunidade surgiu por conta do meu trabalho compartilhando sobre a minha vida e sobre a minha experiência no mundo no meu blog e nas redes sociais - uma empresa de intercâmbio me convidou pra ir pra Dublin criar conteúdo sobre a vida na Irlanda para brasileiros. Eu fui e até hoje não voltei.
A Irlanda me escolheu, mas eu acredito muito que a decisão de morar fora nasceu e cresceu junto comigo muito antes de eu me entender por gente. Eu sempre fui aquela criança que falava para a família que quando crescesse iria morar no exterior. Ninguém da minha família havia saído do brasil antes, muitos nem se quer haviam saído do sul do Brasil. Eu lembro de assistir o filme "Lizzie McGuire um sonho popstar" em videocassete e ficar muito animada contando para todo mundo que eu um dia eu iria visitar Roma e morar em algum país perto do Coliseu. Os adultos na minha volta riam, pediam para eu repetir o meu sonho várias vezes e diziam pros meus pais "nossa, mas ela é sonhadora né?!?!". Meus pais concordavam mas nunca duvidaram do meu potencial, eles sempre souberam que o meu sonho não era apenas um sonho... e que um dia, tudo que eu dizia iria se tornar realidade.

Aos 16 anos eu fiz a minha primeira viagem sozinha para o exterior, e foi aí que eu não apenas realizei o meu sonho de voar para fora do Brasil, mas eu também tive a certeza de que a Europa era o meu lugar no mundo. Essa era a época em que as meninas da minha escola estavam fazendo as suas festas de 15 anos e viajando pra Disney e eu não tive interesse em fazer nenhuma dessas duas coisas. Em um dia ordinário em 2013 o meu pai me vê arrumando o cabelo no banheiro, pede licença e pergunta se eu não gostaria de ir visitar uma amiga que havia se mudado com a mãe para a Escandinávia. Meu pai sempre foi muito brincalhão comigo - de cara eu não levei ele a sério e não entendi a pergunta como um convite, mas mesmo assim respondi dizendo que sim. Dias depois ele me presenteou com passagens para ir passar um verão na Suécia e na Dinamarca. Foi aí que a minha vida mudou. Eu voltei pro Brasil determinada a voltar pra Europa! Terminei o ensino médio, escrevi muito no meu blog sobre os meus sonhos e a minha experiência na Escandinávia e trabalhei muito para bancar a minha próxima viagem - a partir daí, as portas do mundo começaram a se abrir pra mim.
BDM: Quais as maiores dificuldades que você encontrou no seu país de destino?
Lembro que na época o que mais me chocou não foi nem o fato de ter ficado na rua, mas sim de ter confiado em alguém que eu acreditava estar no mesmo barco que eu e ter quebrado a cara.
E: A maior dificuldade na minha opinião é viver a vida longe da família, sem ter uma rede de apoio. O início de uma vida no exterior é repleta de desafios e pequenas dificuldades: você tem que construir uma vida do 0 em um lugar desconhecido, criar um novo ciclo de contatos e amizades, muitas vezes viver meses com o dinheiro contado, além de se estressar muito com documentações e burocracias. Isso sem contar quando você não cai em golpes por não conhecer o lugar, ou acaba caindo nas mãos de pessoas que se aproveitam de você por saber que você é nova na cidade... Enfim, várias situações chatas que são difíceis quando você está perto da família e que ficam 100x mais desafiadoras quando você se vê sozinho no mundo.
Assim que eu me mudei para Irlanda eu aluguei um apartamento de uma Brasileira que trabalhava pra um landlord (proprietário), o apartamento era pra mim e outros 3 colegas brasileiros que também recém tinha chegado em Dublin. A gente pagava uns 500 euros cada para dividir um quarto e dormir em beliches. Pagamos o nosso aluguel do mês e o depósito de seguro-caução pro apartamento (acho que deu uns 4-6 mil euros em total) tudo certinho e na semana seguinte a mulher nos colocou pra fora porque tinha alugado o apartamento pra outra pessoa que provavelmente estava disposta a pagar ainda mais que a gente. Ficamos na rua na semana do St Patricks Day quando a cidade e os hotéis estavam todos lotados de turistas e desde aquele dia eu nunca mais vi a cor do meu dinheiro. Sorte a nossa que fomos convidados por outros conhecidos para ir passar um tempo na casa deles até encontrarmos outro lugar. Imagina? Ficar sem ter pra onde ir, com dinheiro contado no bolso, sem poder correr para casa de nenhum parente ou amigo de longa data....
São perrengues desse tipo que acontecem e nos ensinam muito sobre a vida e sobre o mundo em que vivemos. Lembro que na época o que mais me chocou não foi nem o fato de ter ficado na rua, mas sim de ter confiado em alguém que eu acreditava estar no mesmo barco que eu e ter quebrado a cara. Eu não queria acreditar que alguém que saiu do mesmo lugar que eu não tivesse empatia e respeito nenhum por nós, pelos nossos sonhos e pela vida que a gente estava tentando construir.

BDM: Do que mais sente saudade no Brasil?
E: Da minha família em primeiro lugar, mas também dos meus amigos, da comida brasileira e das frutas e verduras, do calor do povo brasileiro e dos dias de sol e céu azul do Brasil. O Brasil é um país muito rico, e tem coisas que a gente só percebe o real valor quando mora fora.
Eu sinto saudades dos almoços em família de domingo, de jogar conversa fora com as amigas relembrando sobre a nossa infância, de abrir a janela do quarto ao acordar e dar de cara com um dia lindo e um sol que nos dá energia e alegria pra começar o dia com o pé direito. São pequenas coisas que fazem grande diferença na nossa vida.
Fora do Brasil não existe colo igual ao colo de mãe, não existem frutas e legumes tão saborosos quanto o da vendinha da esquina, e por mais que eu ame muito os amigos que tenho fora do brasil, eu sei que também não nunca vou encontrar amizade igual a que tenho com os amigos com quem cresci junto.
BDM: Quais são as coisas das quais você mais se orgulha?
Trabalhei fazendo limpeza, sendo garçonete, barista e banquei uma faculdade na gringa trabalhando em 3 lugares diferentes ao mesmo tempo.
E: De ter sido focada, determinada e disciplinada por tantos anos para construir uma vida e uma carreira no exterior do jeitinho que eu sonhava quando eu era criança. A Emille de 7 anos que assistia o filme da Lizzie Mcguire estaria muito feliz e orgulhosa de ver a Emille de hoje.
Eu fui inicialmente para Irlanda passar 6 meses com a grana que eu faço em um mês de trabalho hoje. Trabalhei fazendo limpeza, sendo garçonete, barista e banquei uma faculdade na gringa trabalhando em 3 lugares diferentes ao mesmo tempo. Conclui a minha faculdade de Marketing sem nunca ter deixado de entregar um trabalho, escrevi o meu tcc na minha segunda língua, tirei uma nota ótima e hoje trabalho na minha área para uma empresa do Vale do Silício. Foram muitos esforços e desafios até chegar aqui onde estou e isso traz muitas vitórias para me orgulhar. No fim todo esforço vale a pena e mesmo eu já tendo conquistado tantas coisas tão novas, eu sei que a minha jornada pelo mundo só está começando.
BDM: Dicas para mulheres que pensam em sair do Brasil?
E: Eu sempre digo para as pessoas que querem sair do país para saírem do Brasil com um objetivo. O mundo é grande e repleto de influências e distrações (boas e ruins) — longe da nossa base é super fácil de nos perdermos. Ter um objetivo em mente nos ajuda a fazer as escolhas certas e passar pelas dificuldades e perrengues com a cabeça erguida. O nosso objetivo nos dá forças quando o mundo parece desabar na nossa cabeça. A segunda dica é sair do brasil de mente aberta para viver a vida de um jeito totalmente diferente do que você está acostumado a viver. A mudança fica muito mais fácil quando ao invés de você lutar contra as diferenças (ou ficar chateada com elas) você abraça e se adapta a elas.

A gente costuma ouvir que a qualidade de vida fora do Brasil é mais alta, e por mais que eu parcialmente concorde com esse ponto de vista, essa não é a realidade de muitos brasileiros que moram fora - principalmente nos nossos primeiros anos. A gente muda do conforto da nossa casa no brasil para dividir quarto e casa com desconhecidos, a gente deixa o nosso trabalho na nossa área de atuação para limpar banheiro e trocar fralda das crianças dos outros. Fazer as unhas e o cabelo no salão deixa de ser uma realidade e prioridade. Essas são algumas das coisas que fazem parte do percurso de muitas brasileiras morando no exterior, mas eu posso te garantir que se você tiver um objetivo em mente e passar "ilesa" por esses momentos difíceis, muito provavelmente essa realidade dura será temporária e não durará muitos anos.
Qualidade de vida, na minha opinião, depende muito dos valores e das prioridades que você tem. Se vê muitas pessoas que tinham vidas muito mais confortáveis no Brasil mas preferem viver em um lugar onde se tem poder de compra. Por isso eu acredito que ter um objetivo e saber quais são os seus valores nessa vida é essencial para que você possa se guiar em direção a sua felicidade e te ajudar a decidir sobre os aspectos da sua vida no exterior em que vale abrir a mão e fazer focar os esforços ou não. Saiba que você é do tamanho dos seus seus sonhos, objetivos e ambições. As suas condições não definem o seu futuro. O mundo é repleto de possibilidades. Tudo que você sonha em fazer você tem o potencial de fazer acontecer. Dentro ou fora do Brasil. O impossível é uma possibilidade que você ainda não conhece!
* Todas as histórias publicadas aqui são reais e oferecidas pelas entrevistadas de forma voluntária. O Brasileiras do Mundo não se responsabiliza pelo conteúdo dos depoimentos.